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  • Foto do escritorCintia Mano

Investimento anjo: bolso, mente e coração


A educação financeira que recebi recomendava poupar o que pudesse e investir com o menor risco possível (poupança). Ao começar a ganhar meu dinheiro passei a estudar mais sobre o tema e a ensaiar pequenos passos rebeldes como, por exemplo, tirar o dinheiro da poupança e investir na renda fixa. Nunca vou esquecer aquele dia. Morria de medo de perder dinheiro e ainda ouvir meu pai dizer “tá vendo? Eu falei pra você, com dinheiro não se brinca!”


Muitos anos se passaram e hoje, depois de erros, acertos e muito aprendizado – sobre investimentos e também sobre o meu comportamento investidor – eu tenho uma carteira bem diversa, com finalidades específicas para cada tipo de investimento. Todos eles unicamente com objetivos financeiros. Exceto um.


Eu invisto em start-ups, como investidora anjo. Um tipo de investimento que não se justifica se for apenas para fazer o dinheiro render.

Costumo dizer que um investidor anjo é alguém que coloca uma parte do seu bolso, do seu coração e de sua mente no negócio de outra pessoa, na expectativa de ter algum tipo de retorno nessas três dimensões.

Eu comecei a me interessar pelo assunto como empreendedora. Há alguns anos deixei uma carreira corporativa bem-sucedida para empreender. Como ex-executiva e então empreendedora eu pensava continuamente na nossa estratégia de financiamento, ou seja, de onde viria o dinheiro para investir na empresa?


Ao longo dessa experiência e depois, como mentora e investidora, pude conhecer melhor as formas mais comuns de financiamento de start-ups. Elas não são as únicas. Também não são excludentes e podem se alterar ao longo do tempo, a depender da fase em que se está:


(1) Recursos próprios: os sócios investem seu próprio dinheiro para início da start-up e, a partir de um determinado momento, a empresa se financia com os próprios resultados. Costuma-se chamar de bootstrapping. O financiamento é limitado pela capacidade financeira dos sócios e pela capacidade da empresa em gerar resultados rapidamente, ou seja, atingir o breakeven e começar a produzir lucros suficientes que permitam reinvestimento.


(2) Investimento anjo: geralmente uma pessoa que conhece o negócio ou mercado em que a start-up atua. Muitas vezes é um (ex-)executivo daquele setor, uma pessoa que tem contatos e pode abrir portas e tem interesse em investir seu próprio dinheiro. O anjo traz então capital, experiência e conexões, tipo de investimento que chamamos de smart money, para diferenciar de um investidor que coloca apenas dinheiro.


(3) Fundos de venture capital: investem dinheiro de outras pessoas (os cotistas dos fundos) e por isso conseguem um volume de investimento mais elevado para a start-up. Poucos são os que atuam na fase de early-stage pois é mais difícil investir dinheiro alheio em uma fase de risco tão alto. O relacionamento do empreendedor mais comum neste caso é com o gestor do fundo e não com os investidores.


Com base na minha vivência e de meus colegas empreendedores, percebi que ou as start-ups tentavam sobreviver com recursos próprios – o que pode não resultar para todos os tipos de start-up – ou tentavam investimento com VCs (Venture Capitals). E isso significava muito tempo investido, pouco conhecimento de como funcionavam os VCs e muitos deals não fechados. Um processo muito frustrante para quem precisa usar seu tempo de forma eficiente.


O investimento anjo naquela época era uma questão de sorte. Sorte de conhecer alguém da área, que se interessasse pela start-up, que tivesse capital para investir, que topasse o risco do investimento e tivesse possibilidade e disponibilidade para ajudar. Era preciso mesmo muita sorte!


Quando passei a mentorar start-ups individualmente ou em programas de aceleração eu conheci muita gente interessante, com negócios ou ideias incríveis e que precisavam de ajuda. Percebi que poderia ajudar mais e gostaria de me comprometer mais com a empresa. Meus investimentos já eram bem diversificados, com uma parcela da minha carteira alocada em ativos de alto risco. Então essa questão de mindset para o risco não era um problema.

“Eu tinha interesse em investir em start-ups, mas também muitas perguntas sobre como começar, como fazer ?”

Muitas eram as questões na minha cabeça: como identificar uma start-up na qual acredite e que possa se beneficiar da minha experiência, networking e investimento? Como avaliar? Quanto investir? Quais os instrumentos contratuais para investimento anjo? Como acompanhar depois?


Após muitas conversas identifiquei algumas possibilidades para investir como anjo:


(1)   Individualmente em uma oportunidade: um (ex-)empreendedor ou (ex-)executivo conhece uma start-up que precisa de investimento. Eles conversam, chegam num acordo e celebram o deal (trâmites e detalhes do negócio). Neste caso, desde a decisão de investir até a contrato de investimento e depois, o acompanhamento da start-up e avaliação sobre a performance do negócio, tudo é feito pelo investidor anjo, sozinho. 


(2)   Coletivamente em uma oportunidade: um grupo de investidores anjo avalia coletivamente algumas start-ups e os que se interessarem por uma específica formam um grupo menor, que negocia o deal e divide o investimento entre os membros. Este grupo então se ajuda na avaliação e negociação e depois se organiza para apoiar a start-up.

Aqui o risco é diluído com outros anjos, mas apenas naquela oportunidade. Se o anjo quiser diversificar seus investimentos, pode compor um grupo com outros três para investir em uma start-up e com outros oito para investir em outra. Mas terá que gerir essas interações.


 (3)   Coletivamente em portfolio: um grupo de investidores decide somar suas potencialidades de capital e investir em um portfólio de start-ups. Avaliam e decidem sobre os investimentos em conjunto. Cada start-up aprovada é investida pela sociedade e não por cada anjo. Todas as etapas, desde o screening de oportunidades até os contratos de investimento, e depois, o acompanhamento das empresas, negociação de follow-ons e exits são feitos pelo grupo.

Hoje invisto coletivamente em portfolios. Além da dupla diluição de risco, há um outro fator que foi decisivo.


Somos uma comunidade: trocamos, aprendemos, ensinamos, compartilhamos informações, fazemos eventos remotos e presenciais para falar de negócios, mas também da vida. Empreendedores que querem dinheiro de qualidade para financiar suas start-ups. Anjos que querem ter retorno financeiro contribuindo para o desenvolvimento dos ecossistemas de inovação. Usando para isso seu capital intelectual, social e profissional e aprendendo com os protagonistas, os empreendedores.

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